terça-feira, 1 de novembro de 2011

Três Pontos Negros XIV

 

Emergir

O céu da boca encontrar na ponta dos dedos e flutuar... Não porque o chão me falta, mas porque a leveza que visita o meu mundo de faz de conta, em terras do nunca e sorrisos de Peter Pan, faz com que os momentos pareçam assim... Tudo que pesava indo embora ou então os ombros sendo fortalecidos para suportar... A força... Até na mais tola sensibilidade, se é que sensibilidades podem ser tolas... Somas e divisões, contrações, contradições, canções... Dias de pensar, refletir, voar, virar bailarina, correr contra o tempo, despedir seringas, dias de me encontrar menina... Jogar bola com as crianças, cantar qualquer cantiga tola que não faça sentido, embriagar qualquer laço de fita em pontas desencontradas, amassar papeis e recriar banquetes... Dias de debruçar os leões cansados e de deparar-se com tabuleiros agigantados e peças confusas, cartas ímpares, baralhos falhos, jogos de azar... Dias de retornar, emergir, respirar, voltar a vida... Mas, de que vida falávamos antes do sol se pôr? Por que ventava antes de se chegar á Europa? Por que fazia frio se já não era inverno? Cadê as flores perfumadas que a primavera deveria reservar aos puros de coração? Cadê que hoje ainda restam puros de coração para além da terra do nunca, do faz de conta de Alice, de Laura, de Arthur e de tantos personagens nem sempre tão fictícios? Pedra de construção, porque te quero canção, antes que amanheça a solidão, de um filme sem legenda em um aramaico qualquer, difícil de ser compreendido... Cinco meses que o amigo de infância foi embora ao encontro de uma paz que nunca teve... Cinco meses e aqui tenho novamente a menina... Cinco meses e quatro esperanças de que um dia tudo isso possa deixar despertar a minha mente, para reparar que as desgraças sempre foram apenas pesadelos infelizes... Jogadas de mestre calavam meus ossos doloridos e a ginga, a roda, a dança e o espaço aberto por que eu saltava... Os dias foram se empilhando e eu submersa sem saber nadar... Faltando-me o ar, a vida, o respirar, o sangue quente a correr nas veias, faltando estrelas cadentes, céus azuis de qualquer planeta distante... Rezando por abduções, reescrevendo canções, musicando poesias, triturando leituras... Emergir sem pressa... Vir à tona... É chegada a hora... Flutuar por entre os espaços, movimentar sorrisos, construir pequenas fagulhas de luz, colher números, palavras, sons, pequenos sinais distantes de que ainda há vida para além dos jogos de iludir e das telas de fazer mágica... Sem pressa e sem preço a felicidade vai e vem como as doces brincadeiras de criança e seus bumerangues em miniatura... A felicidade... A espera... Paciênca... A ciência de estar em paz consigo mesmo... A ciência de abandonar as dores que vem de dentro pra fora e começar a sorrir de fora pra dentro... Não, meu caro amigo, não é Confortably Numb... Não, baby, não é ficção... Não é nada disso... É vida real, mortos na esquina, lágrimas verdadeiras... Pedras e tropeços, mas acima de tudo, equilíbrio, baby... Que não é só de tranquilidade e caminho plano que se constrói a estrada... Que é preciso ser bailarino por muitas vezes para não cair no primeiro tropeço... Já dizia o poeta que no meio do caminho tinha uma pedra... Alguns tropeçam e caem quando topam com ela e os outros utilizam-na para impulsionar um pulo mais alto, um ganho de distância, um subir, alçar vôo, superar alturas, espaços e tristezas do descaminho...

Emergir... Subir bem alto... Cair pra cima... É hora de despertar...

 

"Fazer da hora errada, a certa".

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