segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

A Força do Silêncio XXII



Simples-cidade: Cada um é o que é

Sígnos e silêncios são pares perfeitos para dores do corpo e da alma. Nem ferem pela palavra, nem pecam pelo gesto. Signos e silêncios discursam um mundo dentro do mundo. Queda meu rosto a embriaguez de mais uma noite, por certo, mal dormida. Quedam-se da alma sorrisos que nunca sorrirão com sinceridade, depois da última magia que o espelho reproduziu. Bebo da fonte que não gera vida, entre pérolas, porcos e entrelinhas, a esta altura do tempo, do espaço e das condições com que caminha a menina, irrelevantes, inconsequentes, insuficientes... Sou um pouco do pó com que te adivinhava... Sou um muito de quase nada. Nem soube encontrar um caminho, nem pude me fazer estrada... Meu rosto cravejou-se de pedregulhos traiçoeiros... Meus dedos enrigeceram de dor e, agora, bem pouco atrevo-me a escrever... Eu mal acordo e já sinto sono... Eu mal respiro e já sinto morte. Do outro lado da estrada, a poeira nubla os cabelos encaracolados e loiros de mais uma vizinhança passageira... E nem eu mesmo sei o quanto detesto tantas passagens ligeiras... Eu: frio, insensato, imaturo, vivente, sobre-vivente... Sou apenas um aparente ser humano feliz... Sou apenas mais uma aparência que enche os olhos do outro... Eu sou o outro, sem nem mesmo ser eu mesmo... Ninguém me questiona, muitos me julgam, poucos me ouvem, raros tentam entender, ninguém consegue... Talvez, seja a dor, ou o medo, ou os espinhos, ou o despetalar da flor... Talvez, seja cansaço, sem nunca ter sido suor... Aviões trazem os brilhos distantes de mais um olhar... Ninguém se importa... Está tudo em copos transparentes... Está tudo em cartelas contadas e manuscritas receitas... Está tudo no sono insistente que impede de viver mais o tempo desperto. Soam ruidos de vento e tempestade, soam bobagens, bem poucas poesias, histórias de homens urbanos e de poemas que me foram escritos... Guarda-se o grito... Aprisiona-se o que já se achava prisioneiro, cai-se de altas construções, produz-se sonhos em fábricas de iludir... A fome de cada marca é criada na sincronia com que as necessidades são condicionadas pelos meios de comunicação.

(De um dia, mês ou ano para outro... Nem sei ao certo).

Nós não sobrevivemos, talvez, nem sequer existamos. Não é mais uma teoria de conspiração. São pensamentos confusos mesmo. É mais uma soma de todos os ítens que se distribuem por papéis e paredes. Pois é, não faz sentido, né? Mas, você nem sabe que sentido isso tudo faz. Todos têm pressa, as ruas estão apinhadas de carros, o calor que inspira litoral e bronze nunca chega, as bebidas são consumidas e consomem. Que liberdade é esta que nos aprisiona na confusão de dias aturdidos? Que liberdade é essa que nos faz condenados a grades e prisões que nós mesmos erguemos? Que liberdade é essa? Perdi a conta do tempo que faz que não assisto TV com a devida atenção. Perdi a conta do tempo que faz que eu deixei de acreditar que existem relações sociais completamente dissociadas de interesses, sejam eles políticos, sejam eles quais forem. Perdi a conta do tempo que faz que eu já não me convenço mais de quase nada. Tudo tão bem encenado que parece real. As politicagens, as políticas, as amizades, os interesses, os sorrisos, as palavras. Tudo tão cartesiano e ao mesmo tempo tão carregado de capitalismo, egoismo e outros tantos 'ismos' a que já estamos acostumados. Faz tempo que as palavras 'respeito', 'verdade', 'obrigado' se perderam ou foram substituídas por outras bem menos verdadeiras, bem menos valorosas. Eu olho para os livros e as páginas em branco que se acumulam ao meu redor. Vejo as roupas, perfumes, tênis e ideias que se espalham pelo guarda-roupa, pela escrivaninha, pela cama... Meus pés descalços denunciam a verdadeira liberdade. Eu durmo quando amanhece. Acordo quando o dia já está no meio. Eu leio, escrevo, canto, vivo. Sento na varanda e ouço os pássaros. Nem sempre eles me irritam tanto quanto já me irritaram. Experimento novos sabores de chá e ouço o 'novo'. O violão tem dado conta do que o sono não dá. Mas, a paz me visita como um estranho que retorna ao ninho sem nunca ter estado nele. Não há mais unhas negras. O que era preto e branco tem cores. Ainda tenho intolerância à mentira e amo poesia, ainda odeio a obsolescência programada e amo meus livros e canções escondidas, ainda odeio chamadas ao celular e amo dragões, odeio webcans e amo paredes brancas. Mas, algo maior está no silêncio e em mim. Nos fones de ouvido, estranhas combinações de Joy Division, SOAD, Alice in Chains, Rammstein e Evanescence trilham minhas corridas. No asfalto cinzento as pessoas cruzam umas com as outras sem cumprimento algum, elas já se olham sem se ver, mas julgam em pensamento a roupa e os passos de quem passa. Tudo bem... Cada um é o que é. E se isso serve de alguma coisa: eu sempre sobrevivo. Sei quem sou e onde estou. A bem da verdade, a noite, o silêncio, este monte de músicas confusas que embalam meus estágios de eterna transformação, as palavras confusas ou não, a aparente melancolia... Eles me tornam melhor. No silêncio de mais uma centena de páginas eu me calo, mas não adormeço. Não posso mudar o mundo inteiro, mas se puder transformar um mundo sequer, se eu puder pelo menos tentar fazer a minha parte, se eu puder dar testemunho de minhas palavras e de minhas ideias... Se eu puder, ao menos, fazer uma dessas coisas... Então, a vida, ainda que breve venha a ser, terá feito sentido. Penduro os meus sonhos num cabide quando o dia é claro e só os visto em dias nublados ou noites frias. É assim que gosto de sonhar. Não preciso provar meus sonhos a ninguém. Eles só têm significado sendo meus. Eu silencio, mas o novo sempre vem e descortina todas as palavras que não foram ditas.



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