sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Amor em pares: Sobre Laura e Arthur V

 

A Chuva era a Trilha Sonora...

Ela tinha fases como a lua. Os olhos não se cansavam da tinta que fazia fundo à parede branca. No cômodo ao lado, raros passos podiam ser ouvidos. A velha máquina de escrever martelada, denunciava a presença. Arthur não dissera muitas palavras, apenas desobstruíra o caminho. O quarto misturava o peso de uma tristeza e a escuridão das janelas fechadas. Sombrias figuras projetadas pela deficiência da luz, denunciavam a tristeza. Ela sentira algo de sua melancolia correr do velho portão até a porta em que Arthur estendia as mãos. A visão do homem-menino aparando a chuva podia ser aterradora. O velho guarda-roupas protegido por jornais, tinha cara de lar, tinha jeito de mãe. O pincel deslizava na parede mal cuidada e a chuva pingava preguiçosa do lado de fora. Fazia frio... Fazia muito frio... Mas, de alguma forma, parecia que o frio era parte daquela casa... Aquela que, talvez, um dia, já tivesse sido um lar. O bolor parecia ser parte integrante daquele espaço. As cores sombrias espalhadas pelos cômodos da casa, contrastavam com a janela lilás. A mesma janela do retrato em preto e branco, tinha cores... O mesmo menino-homem e seu olhar triste, um dia, já haviam sido sorridentes. Quem transforma olhares alegres em faces sombrias? O destino, o tempo, o azar, o universo? Laura não sabia... Mas, ela sentia... Muitas almas tristes habitavam aquele espaço. Uma com carne, osso e dores no olhar martelava nervosamente uma velha máquina de escrever, no outro cômodo... Laura vira as três cadeiras na mesa da cozinha e lembrará do dia chuvoso e do rapaz correndo pela avenida... Laura olhara as três cadeiras e lembrara a moça de vestido florido e olhar triste do retrato... Ela sabia que o que antes era habitado em três, agora guardava apenas um coração retalhado, um anjo solitário, um olhar fosco, um sonho interrompido... Na manhã gelada, a chuva era a trilha sonora. A máquina de escrever, o efeito... A lembrança da dor era um adendo... Para fora do velho portão, o mundo não existia... Para fora dos corações sofridos, tudo estava mais nublado que o normal... Mas, o que era a normalidade para aqueles que não a conheciam? O mundo perdia o sentido, o dia passava corrido... Os homens aceleravam os passos em algum lugar... Mas, naquela casa, só havia agora, uma calma estranha... Uma calma que feria o silêncio com máquinas de escrever e chuva...

2 comentários:

  1. Quando o coração se retrai e está imerso em melancolia, os enigmas ganham, aos poucos, respostas que se opõem, mas se complementam neste confuso percurso da vida e do amor. Laura sofre, mas parece nem saber porque sofre. Hemingway detalhou o cheiro da morte em "Por Quem os Sinos Dobram"; Laura deve estar sentindo o cheiro da despedida. Mas será que ela virá?

    Belíssimo texto, Darla!

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  2. Uma das coisas que me leva a seus textos é a forma como de alguma forma eles se parecem comigo de alguma forma... Saber que vocêpercebe as entrelinhas e linhas dos meus, faz com que eu admire ainda mais a sua sensibilidade... Sempre grata pelas visitas comentários e pela sua habilidade de expôr sentimentos em palavras...

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