segunda-feira, 17 de outubro de 2011

A Força do Silêncio XVI




Controle remoto

“O homem é o lobo do homem”. (Thomas Hobbes)

‘Ta lá mais um corpo estendido no chão’. O motivo pode ser uma bala de qualquer calibre, um atropelamento, uma confusão... Uma confusão qualquer? Um calibre qualquer? Ah...Qual é o seu problema? Tem gente morrendo por causa disso!!! Mas, é mais fácil... É bem mais fácil mudar de canal e não ver o mundo acabando todos os dias para alguns milhares... Vai lá! Troque o canal rapidinho, pra não perceber que o programado de verdade é você. Parece feita, perdida em letra de música, mas é muito mais que isso... É vida assistida na esquina. O corpo estendido no chão... As pessoas correm... A ideologia bonita que prega a fraternidade, diria que elas correm pra socorrer, que elas se apiedam... Mas, é lamentável... Não é nada disso... As pessoas correm para assistir o espetáculo de horrores, as lágrimas, os medos, as faces e os metais retorcidos... Ninguém se atreve a estender a mão... (Olha a ideologia bonita aí de novo). A notícia trágica é mel em lábios e ouvidos sagazes, sensacionaliza a perda, potencializa a propaganda... Eu diria até que o infeliz expectador de atropelamento sai, na maioria das vezes, com o ego massageado por ter testemunhado a ocorrência, por ter vendido a melhor fotografia... Pobres abutres, caçando a desgraça em troca de alguns tostões... Você não precisa concordar comigo, basta perceber que faz algum sentido... Um conjunto de curiosos sempre emenda-se em expectativa quando a tragédia acontece no meio da rua. Já quando ela vira manchete repetida nos jornalísticos de todos os canais, a pecinha do comodismo cai como uma luva: controle remoto nele... E as tragédias, por mais reais que possam ser, passam a parecer fantasias repetidas... A tela que não é tão mágica, pede audiência às custas da dor alheia... Mas ninguém sente mais nada... Porque entre as abordagens dos mundos que sucumbem todos os dias, sempre há uma celebridade, um jingle, um produto pra distrair a atenção e o bolso do cidadão... E sempre haverão os tributos, e os aniversários de morte, e os depoimentos das vítimas, e as falsas imagens heróicas, e os malvados vilões... A peça é toda tão previsível, mas poucos percebem quando ela se ensaia. Controle remoto... Eu bem queria ter um. De preferência um daqueles com jeito de “click” em que as pessoas pudessem controlar a velocidade das coisas, circunstâncias, sentidos... Mas, quer saber? Isso não teria a menor graça... Desaprendi a utilizar controle remoto, quando descobri que ele é que me controlava e mantinha-me em remota ação... E faz tanto tempo que nem lembro mais. Naquela época a gente ainda brincava com bonecas e carrinhos de plástico quando tinha 12 anos... Naquela época a gente ainda achava que os sonhos iam se realizar sozinhos... Naquela época eu ainda acreditava que o meio corrompia as pessoas e , descobrir, que as pessoas é que corrompiam o meio foi algo frustrante... As janelas e cortinas detonadas de uma escola pública denunciam que os tempos mudaram, que os grilhões que nos forjavam mudaram de face... “Ta lá mais um corpo estendido no chão”. Mesmo assim as pessoas seguem seu ritmo apressado e egoísta... Ninguém tem tempo... Ninguém se importa... Se o quintal ainda floresce para o seu lado do muro, tudo está em paz... A massa se agita! Os ídolos se transformam, a natureza o homem ainda tem cara de tempos absolutistas. “O homem é o lobo do homem”. O homem é seu próprio predador. As armas são outras, mas o desafio é o mesmo. Os homens competem pra saber quem sabe mais, competem porque querer ser melhores que os outros...Eles não têm tempo para tragédias alheias. Eles não têm tempo nem para si mesmos, mas continuam fingindo que se importam e mudando de canal, sempre que a desgraça sôa entediante demais para ser assistida. As verdades criadas e consumidas... As verdades assistidas não são boas ou ruins o suficiente para manter a atenção. Então, A gente muda de canal pra não ter que mudar de idéia, de opinião, de valores. Muda de canal pra não fazer a verdadeira revolução: transformar-se para transformar o mundo a sua volta. Ou pelo menos, tentar.




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