segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Três Pontos Negros III

 

 Universos Reticentes

"Está tudo em tudo... Está tudo em tudo..." Um grande homem repete isso com uma frequência e uma certeza que assustam o espírito... A praça com parque de diversões em formato de barco, os cães passeando livres pela grama verde... Está tudo em tudo... Não... Não está... Não está aqui quem me levava pela mão da última vez... Não está aqui e displicente deseja sorte e saúde sabendo que nem um e nem outro existem agora... Eu ouso fugir das ruas cimentadas que encontram-se ao mar displicentemente machucado pelas calçadas e pedras forjadas que o delimitam... No táxi não há o sorriso bobo de um finalmente que acontecia, mas, sim, um banco vazio e uma bolsa verde e sem graça, tão militar quanto inútil, porque o que era realmente necessário não está mais ali. Eu chego a praia do forte em que nunca pousamos nossos pés juntos na areia, depois de ter perfilado longas dezenas de minutos no mar desta ilha. Eu paro na margem de um nada que se faz sem a sua presença... Respiro fundo, conto até dez, conto até vinte, tenho olhos fechados, sinto a presença do que não está tão perto assim... Queima o sol desconsolado do meio-dia em meu rosto pálido, agride com força o meu olhar, este vento... Curvo-me no pensamento de um prisma diferente... Abro os olhos e a negror das roupas não contrasta mais com a beleza distante de uma ilha... O meu conforto agora, tem colo de outros dias, tem palavras de outros olhares, tem música oitentista e vodka barata às três da manhã... Tocam-se de leve os corpos, tocam-se de leve as almas, sorriem tensos os dois solitários, os dois inconformados, tão seguramente em meio a uma multidão, um na companhia do outro, ambos sozinhos... Tudo na sufocante multidão remete ao fato de já fazer três dezenas de dias que ele passou pelo portão de embarque, mas de leve uma mão quente segura a minha e foge da multidão... Uma corrente de alívio por esquecer por dois segundos do mago que distante perdeu-se de si mesmo e foge desajeitado sem saber que eu sei até do que ele nem imagina... A gente se perde na multidão e aposta um nada no Bis que a banda dará, se é que ela dará... A gente vai embora de mansinho, mas o mago distante não vai embora de mim, não foge... Chovia fino na noite em que nenhum de nós conseguiu sentir-se menos só em meio aquela multidão da vazios comprimidos com copos nas mãos... Fazia vento e tinha sol no dia em que abandonei o meu último sorriso sincero no portão de embarque... Sobrevivo de livros, de ausências, não padeço do mal de te insultar... Quero que o tempo te dê em dobro tudo o que me deres ou que me destes ou que me darás... 


"E você continua indo embora, e eu continuo ficando, vendo você levar partes de mim que antes eu nem sentia falta".
(Caio Fernando Abreu)

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