sábado, 5 de novembro de 2011

Três Pontos Negros XVIII

 

Com o Tempo...

A gente percebe que as distâncias são partes irrelevantes e que não importa o quão aparentemente longe alguém esteja é o que você sente que torna próximos os ausentes... Com o tempo, a gente deixa de ser imediatista e passa a ter paciência, aprende a aceitar e a se esforçar para entender que nem todas as flores são feitas apenas de cor e perfume e que as mais raras também são dotadas de espinhos... Por um pouco de tempo e para tê-lo, a gente aprende a adiar o 'inadiável', a ouvir o 'inaudível', a compreender o 'incompreensível'... O tempo transforma sensações ruins em pedidos de perdão e grandes passagens em profundas reflexões... O tempo faz a gente pensar em canções e repetir imagens, rever fotografias e reescrever poemas... O tempo não adia a vida, mas ensina que ela é muito mais que um ponto de vista individual... Com o tempo, a gente aprende a amar o outro, mesmo que ele não seja perfeito e descobre na tolerância à imperfeição, o que realmente é amor... Amigo do tempo, o esquecimento, muitas vezes, tenta seguir seu rumo e destrilhar nossos vagões, então, compomos canções... Andamos de pés descalços pela calçada das lembranças, avançamos mais alguns centímetros, porque a ponte do acaso parece mesmo irresistível... Depois, a gente dorme, sonha, acorda e começa tudo de novo... Que o tempo é mesmo louco... Às vezes tanto se arrasta, por vezes, muito acelera e quando a gente vê, já passou... Passou rápido demais, porque era bom... Passou devagar demais, porque estava entediante... Por que tinha que passar? Por que ainda não chegou? Ah... O tempo... Cheio de faces e de entrelinhas, preguiçoso e acelerado, simples e complicado... Há tempos de se crescer e tempos de voltar a ser criança... Há tempos de recordar e tempos de nem pensar... De fazer as malas e de refazer as viagens... Tempos de eternizar paisagens que só existem em nossos pesadelos e pensamentos... O tempo levou setembro, trouxe outubro, aproximou novembro e fará chegar janeiro... Tempo passageiro, tempo passará, tempo viajante, em tempos de viajar... Encontro as palavras guardadas que me escrevias, os retratos doados, furtadas as fotografias... Releio as tuas poesias, que no teatro do tempo só você não passa, meu bem... A gente vai passando com o ponteiro, mas leva aquilo que é nosso. Leva no peito os mesmos sentidos que se alteram, no pensamento as mesmas lembranças que imperam, no olhar os mesmos brilhos e foscas passagens de outrora. O tempo trouxe a mão forte, os olhos densos e não os leva consigo. Porque ele nem sempre foi amigo do esquecimento... Porque o meu tempo, quando é pra ti, só tem lembranças e não lacunas passadas... Porque o meu dia, quando é por ti, faz-se de leveza... Que o relógio que não tenho, não silencia o tic-tac nas contagens regressivas... Com o tempo, as coisas voltam ao seu devido lugar ou passam a ocupar novos horizontes. Ninguém brinca de fugir dos ponteiros do relógio, ninguém crê tanto em destino a ponto de não mudá-lo... Ninguém entende que o meu tempo, em variáveis confusas, continua a ver você todos os dias, em cada fagulha reacesa nos vitrais do sono profundo... E pouco menos entenderão do pêndulo que balançava quando adormeci. As pegadas discretas deixadas na areia das vidas por que pisei dizem que você esteve lá... A sincronia das músicas e o universo de palavras que aquece um mundo só meu, que ninguém entende, denunciam que há algo mais. Algo mais que ainda não tenho maturidade para compreender... Mas, o tempo, velho amigo, há de nos ser um caminho de aprendizado para um par de vidas que ainda dará certo vezes de amar ou planejar atentados e escrever universos em madrugadas de bar e violões desafinados... Tudo o que há de ruim, meu bem... Tudo o que, um dia, fez-se dor... Passará... Com o tempo... E naverá um tempo de brincar de voltar a ser criança e de aprender a ser adulto, sem pesos, nem culpas, nem dores, nem ausências... Tudo isso fará as sombras de tristeza se esconderem por vergonha de uma luz articial qualquer... Com o tempo tudo será apenas uma história pra contar ou um par irresistível de vidas a se libertar...


 
"Mas, a gente esquecia de afastar as cortinas e o tempo escorria matreiro pela ampulheta da vida".

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