domingo, 21 de agosto de 2011

Prosas que o Mundo dá XXVI


A solidão é uma sensação...

A grande súplica da solidão é que a alimentem... Solidão é uma sensação que não tem relação com o número de pessoas que o cerca em um determinado momento e, sim, com a sua capacidade de não conseguir inteirar-se do meio... Solidão se alimenta de introspecção e de intolerância... Pode ser sombria, mas também pode ser um leve e poderoso processo de conhecer a si mesmo... Algum pensador, em algum momento qualquer, que não lembro agora e que não necessito citar, já dizia que há um pouco de você em tudo o que você julga enxergar... Se a solidão te completa, você saberá que só em solidão você é realmente quem é... Somente sozinhos somos reais, ousamos planejar atitudes, não representamos personagens, não levantamos máscaras... Não é nossa homossexualidade, nem são nossas paixões, nem nossos amigos, nem nossas músicas prediletas... Não são as coisas que nos fazem chorar, nem quantos cigarros são necessários pra acalmar... Vinhos e viagens paralelas farão sorrisos despencarem dos lábios e amigos sorridentes tentarem uma participação maior em nossa existência... Sim... Isso acontecerá, mas ainda haverá solidão na superficialidade dos seus dias, porque toda vez que a cabeça exausta tocar o travesseiro frio e não houver do outro lado do leito um corpo quente em se aconchegar e ouvidos abertos para lhe compreender, mesmo que você nada diga... Ainda alimentada estará a solidão... Na intolerância de suas palavras ou na ausência das mesmas, você priva o mundo de você e se priva do mundo... Pode embarcar em devaneios de fumaça e deixar que sua natureza ácida corrompa a você mesmo muito mais do que a qualquer outro ser... Mas os outros se afastarão, pois sabem que sempre haverá um outro espinho mais afiado, uma outra palavra mais corrosiva, agressiva... Os outros não vêem, menino, mas eu vejo... Que cada vez que você arremessa uma pedra é para pedir um abraço... Que sempre que a voz se altera e ofende é esperando que ao invés da reação igual haja um corpo e um conforto em que se aninhar... Eu sei e você sabe, que eu sei... Que isso ainda acontecerá muitas vezes... E que você ainda chorará suas mágoas e fugirá delas por anos a fio... Eu sei que doem ausências, sei que doem palavras, sei que doem saudades, sei que dói a solidão... Mas, a solidão é uma sensação, um animal que precisa ser alimentado, um rio profundo e com correntezas fortes demais para se atravessar ileso... E, por algum motivo, meu menino, você teima em seguir às margens desse rio, obcecado pelo movimento de suas águas e pelo azul escurecido que emana delas... Antes que você odeie o mundo, pergunte-se quantos outros agredidos, também não estão como você... Pergunte-se qual a sensação de ouvir as coisas que você diz... Haverá quem te faça isso também, o mesmo que fazes com quem te gosta... E eu falo isso porque te vi crescer e espero vê-lo amadurecer ainda mais... O suficiente para que meça as palavras e fale o que realmente sente... Espero vê-lo grande o suficiente para encontrar no respeito pelos outros e por si mesmo uma oportunidade para dizer um basta a todos os muros que escondem quem tu és de verdade... Uma criatura sensível e inteligente, capaz de amores impossíveis e de ser o melhor ser humano, o menos só e o mais falho embora não corrosivo... Acredite menino você não precisa ser uma peça que se encaixa e nem ser normal... É tolice querer isso se já há tantas peças encaixadas e inúteis no mundo e se há tantos iguais que buscam fazer uma diferença que você já faz... Faça um chá, aqueça-se ao cobertor, ouça The Doors, relaxe os sentidos, esqueça as mágoas, as dores, os amores, as palavras despejadas por raiva, esqueça a ira, aquiete-se ao colo materno, não peça nada em troca apenas ame, não peça que a solidão não vá ferí-lo se você dela se alimentar... E quando apagar a luz apegue-se ao que os seus olhos não alcançam... Relembre poesias, músicas, amores e quimeras, lembre de silêncios e de corações pulsando acelerado... E compreenda a solidão é uma sensação que pode te levar a conhecer o mundo dentro de você ou que pode te levar a fugir do mundo que existe para fora das suas janelas... escolha não escolher, apenas viva... mas viva para ser o alguém por trás da personagem em que se esconde... o alguém que sente e não o que finge não sentir mais nada... o alguém que respeita e não aquele que quer do desrespeito se armar para demonstrar o que há por trás da cortina de ferro dos teus olhos... alguém me disse o que te digo agora... paz e paciência, menino... os anos passam a vida muda e você deixará seus muros cairem ou tornará eles ainda maiores e mais intransponíveis do que já o são?

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